Edição especial do Radar Político da Saúde categorizou mais de 2.500 proposições do Congresso Nacional em 2024
Criação de datas simbólicas, propostas que entram em conflito ou duplicam normas já existentes e poucas iniciativas voltadas para grupos historicamente negligenciados são algumas das conclusões sobre a atuação do Congresso Nacional na Saúde apresentadas na edição especial do Radar Político da Saúde - A Saúde no Congresso Nacional em 2024. A publicação é uma produção do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS), em uma parceria com a Umane que conta com o apoio da Eixo Estratégia Política e do Instituto Infinis, e apresenta uma categorização de mais de 2.500 propostas legislativas que tramitam na Comissão de Assuntos Sociais (CAS), do Senado, e nas comissões de Saúde (CSAÚDE) e de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família (CPASF), da Câmara dos Deputados.

Para Rebeca Freitas, diretora de Relações Institucionais do IEPS, a publicação traz contribuições importantes para o controle social e o monitoramento da atuação parlamentar na Saúde. “Mais do que contabilizar o volume de proposições, é fundamental analisar com profundidade o conteúdo e os impactos das proposições legislativas sobre o SUS. A partir de dados do ano de 2024, o estudo que realizamos permitiu evidenciar que uma parte expressiva da produção legislativa sobre saúde se sobrepõe ou contraria políticas públicas já existentes e desconsidera critérios orçamentários, técnicos e de pactuação que balizam a tomada de decisão no sistema de saúde”, destacou.
Categorias de análise e visualização de dados
Do total de propostas, foram identificadas 719 proposições relacionadas à saúde na Câmara e 595 no Senado, totalizando 1.314 proposições relacionadas à saúde, sendo 683 projetos e 631 requerimentos. As proposições foram analisadas por tema, objetivo, público-alvo e pelo tipo de relação com as políticas públicas existentes, classificadas como de complementação, contraposição, sobreposição ou inovação.

Os dados de cada classificação foram adaptados em gráficos interativos para facilitar a compreensão das áreas que têm concentrado a atenção legislativa, quais propostas contribuem com inovações relevantes e onde ainda persistem lacunas, duplicações ou tensões normativas. Além da visualização interativa, os principais destaques a pesquisa estão reunidos em um Fact sheet, que pode ser acessado aqui.
37% dos projetos entram em conflito ou duplicam normas já existentes, sem inovação ou articulação com políticas públicas vigentes
De acordo com a publicação, dos 585 projetos que estabelecem alguma relação com políticas públicas já existentes, aproximadamente 37% dos projetos entram em conflito ou duplicam políticas de saúde já existentes, replicando normas já previstas em portarias, resoluções ou protocolos técnicos.
Apesar de a consolidação como lei reforçar seu caráter de política de Estado, o levantamento aponta que, por outro lado, pode também engessar a normativa, já que qualquer atualização exigirá nova aprovação pelo Congresso, dificultando a atualização e adaptação das normas a mudanças de contexto ou novas evidências.
Além disso, muitas das proposições impõem obrigações diretas ao SUS sem considerar os processos técnicos de pactuação e avaliação, especialmente em temas como tecnologias em saúde, regulação sanitária e saúde mental.
Campanhas simbólicas representaram 14% das proposições em 2024; medidas com foco na estrutura do sistema menos de 10%
Outra conclusão da pesquisa mostra que o Congresso dedicou boa parte dos seus esforços criando datas simbólicas, como o “Dia Nacional de Cuidados com as Mãos” e o “Dia Nacional do Sono”. Dos 683 projetos de lei analisados, cerca de 14% dos projetos analisados têm como objetivo principal a realização de campanhas de conscientização ou criação de datas para o reconhecimento simbólico de causas específicas na Saúde. No Senado, a proporção de projetos desse tipo chega a 17% e na Câmara a 13%.
Por outro lado, menos de 10% dos projetos em cada Casa se dedicam a aprimoramentos estruturantes do sistema de saúde, o que reforça uma tendência de atuação legislativa focada em medidas pontuais e de apelo público, em detrimento de iniciativas que poderiam gerar impacto sistêmico mais profundo no SUS.
13% das propostas são voltadas à saúde mental e doenças específicas, mas com produção fragmentada e pouco convergente às políticas do SUS
A edição do Radar da Saúde também mostrou que, no universo dos 585 projetos que se relacionam com políticas públicas já existentes, as iniciativas voltadas para saúde mental e condições específicas de saúde apresentam caráter pontual, desarticulado de políticas nacionais já existentes. Além disso, parte das proposições contradiz diretrizes da Reforma Psiquiátrica e da RAPS, como internações involuntárias e inclusão de comunidades terapêuticas no SUS.
Além disso, projetos sobre doenças raras e crônicas, como o Projeto de Lei (PL) 410/2019 e o PL 1.1217/2018, que pretendem equipar a Síndrome de Von Recklinghausen e a Fissura Palatina ou Labiopalatina, respectivamente, às deficiências físicas e intelectuais, frequentemente impõem obrigações ao SUS sem avaliação técnica prévia. Segundo a publicação, 30% dos projetos com foco em condições clínicas específicas propõem o seu reconhecimento como deficiência e na maioria dos casos faz isso de forma desarticulada do escopo da Lei Brasileira de Inclusão.
“Apesar de propostas sobre saúde mental e condições clínicas específicas refletirem preocupações legítimas da sociedade brasileira, a forma como algumas propostas são apresentadas pelo Congresso reforça uma atuação legislativa não conectada aos princípios e ao modo de funcionamento do SUS”, explicou Sara Tavares, analista de políticas públicas do IEPS.
Radar Político da Saúde: novo nome e identidade visual
O Radar Político da Saúde, antes chamado apenas de “Radar da Saúde”, é uma iniciativa de monitoramento da atuação do Legislativo e do Executivo Federal em temas estratégicos da saúde. O Radar é publicado a cada bimestre desde setembro de 2024.
Nesta edição especial, a publicação foca em uma análise anual da atuação do Legislativo Federal, identificando padrões e prioridades e contribuindo para que a sociedade brasileira conheça como o Congresso tem trabalhado pela saúde brasileira.
Além do lançamento da edição anual e do novo nome, apresentamos também uma nova identidade visual, mais ampla e moderna, e novas possibilidades de comunicação dos resultados por meio de infográficos e conteúdos interativos.